O transtorno do espectro autista
Por Paulo  Liberalesso

O transtorno do espectro autista (TEA) é hoje uma das condições neurológicas mais estudadas por pesquisadores e neurocientistas ao redor de todo o mundo. Com o passar dos anos, temos compreendido que o TEA é uma peça dentro de um gigantesco quebra-cabeça, onde as outras peças são representadas por múltiplas condições neurológicas e psiquiátricas. Como costumamos dizer: “O TEA geralmente não está sozinho”.

Estudos recentes nos mostram, de forma cada vez mais clara, que uma parcela considerável das pessoas com autismo apresenta outras alterações comportamentais e de desenvolvimento, que podem nos levar a um complexo emaranhado de diagnósticos associados.

Um fato muito interessante é que grandes estudos populacionais têm demonstrado um aumento na prevalência não somente do TEA, mas de muitas doenças neurológicas e psiquiátricas, como a depressão, transtorno afetivo bipolar, esquizofrenia, lesões autoprovocadas intencionalmente e casos de suicídio. A verdade é que, até este momento, não somos capazes de explicar exatamente os motivos do aumento no diagnóstico destas condições.

Mas é fato que pessoas com TEA têm um risco significativamente maior de desenvolver doenças do sistema nervoso central. Um estudo recente que avaliou mais de seiscentas crianças e adolescentes com autismo, com idade entre 3 e 17 anos, mostrou que 30% tinham também deficiência intelectual, 81% transtorno do déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), 46% transtorno opositor desafiante, 12% transtorno de conduta, 42% transtorno de ansiedade e 8% tinham transtorno de humor. Outro aspecto que também chamou atenção neste estudo é que 66% das pessoas com TEA tiveram a associação de outras duas ou mais doenças neuropsiquiátricas.

Bom, agora que sabemos que o TEA geralmente não está sozinho, isso deveria nos trazer uma reflexão… Nós estamos realmente investigando e tratando todas estas demais doenças comórbidas ao TEA?

Infelizmente, a resposta é não… em muitas crianças e adolescentes, talvez na maioria delas, todos os sinais e sintomas comportamentais são atribuídos indiscriminadamente ao autismo, o que muitas vezes leva a tratamentos incorretos ou incompletos.

Portanto, se uma pessoa apresenta diagnóstico de TEA e depressão ou TEA e TDAH, evidentemente deveríamos tratar TODAS as condições, com as terapias adequadas, antidepressivos e psicoestimulantes, respectivamente.

Desse modo, durante a consulta de uma criança com TEA, o médico deve estar muito atento aos sintomas que podem não pertencer ao autismo propriamente dito. Identificar e tratar precocemente todas as doenças associadas ao TEA pode representar uma linha divisória entre o sucesso e a falha terapêutica.

Paulo Breno Noronha Liberalesso, MD, Ph.D, é médico do Departamento de Neurologia Pediátrica do Hospital Pequeno Príncipe, médico do Cerena (Centro de Reabilitação Neuropediátrica Hospital Menino Deus), em Curitiba (PR), mestre em neurociência, doutor em distúrbios da comunicação humana e presidente do Departamento de Neuropediatria da Sociedade Paranaense de Pediatria.

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